“Não fica nada no prato”; “Se parares de chorar, dou-te um chocolate”; “Se comeres tudo, a seguir podes ir brincar”. Frases destas são o “prato do dia” de muitos momentos de refeição que envolvem adultos e crianças. Na hora das refeições, emoções e alimentos são ingredientes que se misturam. Com alguma frequência, nos contextos de alimentação diários (casa e escola) surgem tensões e “batalhas” entre adultos e crianças que desencadeiam emoções negativas, como frustração, raiva e tristeza, que, por seu turno, afetam a qualidade das refeições.
Compete aos adultos decidir como lidar com a relutância ou recusas em comer das crianças [1]. Por exemplo, se optam por responder com zanga à recusa de comer vegetais, esta resposta pode aumentar a experiência emocional negativa da criança face a estes alimentos saudáveis. De um modo semelhante, se os doces estão associados ao desempenho das crianças e a momentos felizes (ex. realizar com sucesso uma atividade; ter um bom comportamento; festa de aniversário), tal pode aumentar a emocionalidade positiva em relação a estes alimentos não saudáveis [2]. Por outro lado, se respondem às emoções negativas das crianças minimizando a sua importância ou punindo de alguma forma, isto pode ter um impacto negativo quer na regulação emocional (i.e., capacidade de responder e lidar com o stress), quer na regulação da ingestão alimentar das crianças. Em particular, este tipo de respostas dos adultos reflete uma ausência de validação e aceitação das emoções das crianças e não as ajudará a lidar com as suas emoções negativas de forma adaptativa [2,3,4]. Pode mesmo afetar a capacidade da criança de responder a pistas de fome e saciedade [5].
As estratégias que os adultos utilizam para regular as emoções das crianças podem, assim, estar associadas ao tipo de páticas que utilizam para regular o seu comportamento alimentar. A este nível, respostas positivas às emoções negativas das crianças refletem-se na utilização de práticas alimentares saudáveis. Por outro lado, as respostas negativas tendem a traduzir-se em práticas alimentares assentes na coerção ou no controlo, associadas a um maior risco para o excesso de peso e obesidade infantil [6,7]. Neste sentido, é importante complementar as respostas atuais que visam a promoção de um estilo de vida saudável e a prevenção da obesidade infantil (focadas na educação alimentar e bem-estar físico), consciencializando para o papel crucial que os adultos significativos (ex. pais, educadores, professores) desempenham enquanto agentes primordiais de socialização das emoções e da alimentação das crianças [6,8,9,10].
Estratégias positivas de regulação emocional e alimentar
– Ajudar a criança a resolver o problema que causou a emoção negativa e a sentir-se melhor; falar sobre a emoção e o que a desencadeou; aceitar e apoiar a expressão emocional da criança. Evitar reagir com zanga, punir e/ou desvalorizar a expressão de emoções negativas por parte da criança.
– Promover um consumo alimentar variado e ser um modelo de alimentação saudável.
– Evitar pressionar para comer mais, utilizar a comida para reforçar um comportamento ou para regular as emoções da criança. É importante preservar a capacidade da criança para identificar pistas internas (e não externas) de fome e de saciedade – aspeto fundamental para uma ingestão calórica mais equilibrada.
– Utilizar técnicas didáticas e que encorajem a ingestão de alimentos saudáveis (ex. elaborar um livro das receitas saudáveis preferidas; envolver na escolha e confeção de alimentos e cozinhar em conjunto uma receita saudável).
No contexto das refeições escolares, qual é a vossa experiência relativamente à implementação destas estratégias? Que tipo de atividades para a promoção de um comportamento alimentar saudável já desenvolveram e qual o grau de envolvimento das famílias?
Referências
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- Power, T. G., Olivera, Y. A., Hill, R. A., Beck, A. D., Hopwood, V., Garcia, K. S., Ramos, G. G., Fisher, J. O., O’Connor, T. M., & Hughes, S. O. (2016). Emotion regulation strategies and childhood obesity in high risk preschoolers. Appetite, 107, 623–627. https://doi.org/10.1016/j.appet.2016.09.008
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