Assistimos, atualmente, à proliferação da utilização da tecnologia no dia a dia das crianças, nos diversos contextos em que estão inseridas. A linguagem digital faz parte das suas vidas, desde muito cedo, através da Internet, mas também dos videojogos, dos telemóveis, ou dos tablets, aos quais recorrem para brincar, aprender e comunicar. É, também, cada vez mais comum, o recurso às tecnologias digitais pelos/as educadores/as de infância, para realizar atividades promotoras do desenvolvimento e da aprendizagem das crianças. Esta utilização pode envolver uma simples pesquisa na Internet ou a exploração de materiais didáticos, embora seja também cada vez mais frequente a utilização da tecnologia para promover uma maior articulação e comunicação, por exemplo, com as famílias [1]. Que competências deverão, então, ter estes profissionais, para uma boa utilização das ferramentas digitais, nestes contextos? Quais benefícios que podemos antecipar, para as crianças, decorrentes de uma boa utilização destas ferramentas?
COMPETÊNCIAS DOS PROFISSIONAIS
Partilhamos um quadro de referência, um conjunto de competências e uma ferramenta de autorreflexão que poderão ser úteis para a reflexão e promoção de competências digitais dos/as educadores/as:
- Um quadro de referência – A Comissão Europeia desenvolveu, em 2018, o Quadro Europeu de Competência Digital para Educadores (DIGCOMPDU) [2]. Este quadro prevê a capacitação digital dos educadores, incluindo educadores de infância, e a integração das tecnologias digitais no âmbito das suas práticas pedagógicas. Esta capacitação representa uma forte aposta na valorização e no desenvolvimento profissional, no domínio da literacia digital e das competências digitais.
- Um conjunto de competências digitais relevantes – O Quadro Europeu destina-se a educadores de todos os níveis da educação, desde a educação de infância ao secundário, incluindo o ensino superior e a educação de adultos, e prevê a existência de 22 competências. Estas competências estão organizadas em três grandes grupos (competências profissionais dos educadores, competências pedagógicas dos educadores e competências das crianças/aprendentes) e em seis áreas distintas (envolvimento profissional, recursos digitais, ensino e aprendizagem, avaliação, capacitação das crianças/aprendentes, e promoção da competência digital das crianças/aprendentes). Assim, este conjunto de competências envolve aspetos diversos como a seleção, criação ou partilha de recursos digitais, a utilização das tecnologias digitais para assegurar a comunicação e o desenvolvimento profissional, mas também a inclusão e o envolvimento ativo das crianças.
- Uma ferramenta de autorreflexão – Para além do Quadro e das competências nele previstas, foi desenvolvida uma ferramenta, designada SELFIE, que apesar de destinada fundamentalmente a profissionais de educação dos ensinos básico e secundário, pode ser preenchida e utilizada por diversos educadores, para que possam realizar uma de autorreflexão sobre as suas competências. A ferramenta, disponível em https://educators-go-digital.jrc.ec.europa.eu/, permite a reflexão em torno de questões relacionadas, por exemplo, com (a) a existência de uma estratégia digital nos contextos educativos, (b) a colaboração com outros educadores ou instituições através das tecnologias, ou (c) o acesso à internet e a utilização dos recursos digitais.
BENEFÍCIOS PARA AS CRIANÇAS
Quando asseguradas práticas de qualidade, na utilização das tecnologias digitais, vários podem ser os benefícios para as crianças. A literatura destaca, por exemplo, benefícios ao nível do desenvolvimento da linguagem (e.g., fluência e complexidade de discurso, comunicação verbal), do pensamento matemático (e.g., contagem, pensamento lógico, resolução de problemas), ou do conhecimento do mundo (e.g., atitude crítica sobre a realidade envolvente). São igualmente referidos benefícios relacionados com o contacto com outras realidades – naturais, sociais e culturais –, assim como uma maior consciencialização, por parte das crianças, sobre aspetos como a diversidade e a multiculturalidade [1, 3, 4].
Tendo por base estes benefícios, várias são as recomendações e iniciativas existentes, a nível internacional, mas também nacional:
- A nível internacional, existem recomendações para a introdução das tecnologias digitais na educação de infância, por parte da UNESCO [5], ou da National Association for the Education of Young Children [6].
- A nível nacional, a utilização de recursos digitais é referida em diversos documentos orientadores, em educação de infância. As Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE) destacam, por exemplo, que os saberes e aprendizagens das crianças podem ser adquiridos com recurso a diversos suportes (bibliográfico, audiovisual, multimédia, digital, etc.) e em diferentes contextos (como museus, galerias, instituições culturais, no contacto com a natureza ou, ainda, através de livros online). É também referido o contacto com atividades artísticas e culturais, através de outras fontes de informação, como os contextos virtuais, consultados online. Ao nível do conhecimento do mundo, as OCEPE referem o facto de, atualmente, as crianças terem acesso a saberes diversos, sobre diversas realidades, muitas vezes adquiridos através de ferramentas ligadas às tecnologias [7]. São, ainda, de destacar iniciativas nacionais da Direção-Geral da Educação, como o Plano de Capacitação Digital de Docentes [8], ou ainda formações específicas para educadores/as de infância [9, 10].
Quais as suas perspetivas e experiências com a utilização de ferramentas digitais em Educação de Infância? Já refletiu, individualmente ou em equipa, sobre as competências digitais previstas no Quadro Europeu? Aguardamos as suas partilhas!
Referências
[1] Laranjeiro, D., Antunes, M. J., & Santos, P. (2017). As tecnologias digitais na aprendizagem das crianças e no envolvimento parental no Jardim de Infância: Estudo exploratório das necessidades das educadoras de infância. Revista Portuguesa de Educação, 30(2), 223-248. https://doi.org/10.21814/rpe.9367. Disponível em https://revistas.rcaap.pt/rpe/article/view/9367
[2] Lucas, M., & Moreira, A. (2018). DigCompEdu: Quadro Europeu de Competência Digital para Educadores. UA Editora. Disponível em: https://area.dge.mec.pt/download/DigCompEdu_2018.pdf
[3] Amante, L. (2007). As TIC na escola e no jardim de infância: Motivos e fatores para a sua integração. Sísifo: Revista de Ciências da Educação, 3, 51-64. Disponível em http://sisifo.ie.ulisboa.pt/index.php/sisifo/article/view/61/78
[4] Brito, R., Dias, P., Barqueira, A., & Silva, J. (2021). A utilização de tecnologias digitais por educadores de infância e crianças que frequentam a educação pré-escolar, em Portugal. ISEC Lisboa
[5] Kalas, I. (2012). ICTs in early childhood care and education – Policy Brief. UNESCO Institute for Information Technologies in Education. http://www.iite.unesco.org/publications/3214720
[6] National Association for the Education of Young Children. (2012). Technology and interactive media as tools in early childhood programs serving children from birth through age 8. National Association for the Education of Young Children. Disponível em https://www.naeyc.org/sites/default/files/globally-shared/downloads/PDFs/resources/position-statements/ps_technology.pdf
[7] Lopes da Silva, I., Marques, L., Mata, L., & Rosa, M. (2016). Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar. Ministério da Educação, Direção-Geral da Educação. Disponível em https://www.dge.mec.pt/orientacoes-curriculares-para-educacao-pre-escolar
[8] Este e outros recursos disponíveis em https://digital.dge.mec.pt
[9] Santos, H., & Silva, M. J. (2022) Educação Pré-Escolar. Enriquecimento dos contextos de aprendizagem para a infância. Ministério da Educação, Direção-Geral da Educação. Disponível em 187-652f922bf4a1e71d8d906c83b84d3c68.pdf (mec.pt)
[10] Direção Geral de Educação. (2023). MOOC – Kit Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Digital das Escolas: Da Reflexão à Inovação. Ministério da Educação, Direção-Geral da Educação. Disponível em https://www.dge.mec.pt/noticias/mooc-kit-pedagogico-de-apoio-ao-desenvolvimento-digital-das-escolas-da-reflexao-inovacao