Autora: Astrid Cornelis (Thomas More, Bélgica) Mensagem original disponível em EarlyYearsBlog.eu
A leitura compartilhada de livros parece promover o desenvolvimento da linguagem, desde que as crianças sejam suficientemente desafiadas. As perguntas que fazemos influenciam o grau de envolvimento das crianças na atividade e o quanto as crianças aprendem com a leitura dos livros em voz alta [1]. Isto faz-nos pensar se fazemos o tipo certo de perguntas. Investigação recente desenvolvida nos Estados Unidos analisou o tipo de perguntas que os/as educadores/as de infância faziam e o tipo de respostas que essas perguntas desencadeavam.
O que é que a investigação revelou?
Os/as educadores/as americanos/as parecem fazer poucas perguntas e perguntas demasiado simples durante a leitura compartilhada de livros [2]:
- Apenas 24% das intervenções eram perguntas.
- 85% dessas perguntas eram respondidas corretamente.
- Mais de metade das perguntas podia ser respondida com um simples “sim” ou “não”.
- 63% das perguntas desencadeavam uma resposta de apenas uma palavra.
- Para além das perguntas de “sim” ou “não”, os/as educadores/as perguntavam “Quem”, “O quê”, “Quando”, “Onde”, mas quase nenhuma pergunta sobre “Porquê” ou “Como” era incluída.
Podemos aprender muito com base nestes resultados e tentar fazer melhor nos nossos contextos.
“Quando as crianças respondem corretamente a 85% das perguntas, isso significa que as perguntas que o/a educador/a está a fazer são demasiado fáceis”, diz um dos investigadores. “Não se trata de fazer apenas perguntas difíceis, mas as crianças precisam de perguntas que as estimulem e desafiem as suas competências de linguagem e as suas capacidades cognitivas. Apenas uma em cada seis perguntas cumpria esse critério específico, enquanto idealmente duas em cada cinco perguntas deveriam ser desafiantes” [3].
Perguntas difíceis, respostas incorretas: Tanto melhor!
Perguntas de “porquê” e “como” exigem uma resposta mais longa e complexa. Por exemplo, enquanto a pergunta “Ficaram de novo amigos?” convida a responder apenas um “sim” ou “não”, a pergunta “Como é que A e B resolveram os seus problemas?” permite não só verificar a compreensão, mas também desafiar a capacidade da criança para a expressar.
Perguntas difíceis podem aumentar o “risco” de uma resposta incorreta. Contudo, isto não é de forma nenhuma motivo para preocupação, uma vez que respostas incorretas podem ser usadas de forma a estimular um pensamento mais preciso. É precisamente com base nesta interação com o/a educador/a que a criança irá aprender: a resposta incorreta oferece uma oportunidade para descobrir a resposta correta (ou mais completa), pensando sobre o assunto e “debatendo” em conjunto. Seria contraprodutivo simplesmente ignorar uma resposta incorreta e convidar outra criança a responder à pergunta. Para além disso, vale bem a pena fazer a mesma pergunta a várias crianças e incentivá-las a interagir umas com as outras.
Então, como fazer? Formular perguntas a diferentes níveis
A taxonomia de Bloom oferece inspiração para fazer perguntas variadas. Idealmente, os/as educadores/as devem fazer perguntas de todas as categorias, incluindo de forma especial as perguntas das categorias mais desafiantes (2-6).
1. Perguntas que testam a memória
Com estas perguntas, podemos verificar se as crianças recordam detalhes da história.
Exemplo: Quem toma conta do espaço de trabalho do Kasper? O que constrói o Flip com a bicicleta?
2. Perguntas que testam a compreensão
Com estas perguntas, podemos verificar se as crianças compreenderam o que foi lido (em voz alta).
Exemplo: Porque é que o Kasper ficou tão cansado?
3. Perguntas de transferência
Estas perguntas são úteis para verificar se as crianças podem aplicar a informação a outras situações.
Exemplo: Na última vez, o Flip escreveu no quadro “Fazemos tudo menos bicicletas”. Será que ele podia escrever alguma coisa no quadro agora, também? O que poderia ser?
4. Perguntas de análise
Estas perguntas ajudam as crianças a aprofundar a sua compreensão do texto.
Exemplo: Pode ajudar as crianças a pensarem na razão ou na explicação para o final diferente das duas histórias, convidando-as a comparar as ações dos ratos.
5. Perguntas de avaliação
As perguntas a este nível têm como objetivo estimular o pensamento crítico e a capacidade de formar uma opinião pessoal.
Exemplo: Pode pedir às crianças para darem a sua opinião em relação à forma como a história termina. Uma pergunta como “Também irias provocar um leão no jardim zoológico para o fazer rugir?” pode estimular as crianças a pensar sobre o que está certo e o que está errado.
6. Perguntas que estimulam o pensamento criativo
“Como achas que a história vai continuar? Imagina que …, o que aconteceria a seguir?”, são perguntas que podem encorajar as crianças a fantasiar acerca de possíveis resultados, enredos… e a contribuir com novas ideias para a história.
Como envolve as crianças na leitura compartilhada de livros? Qual é a sua experiência com perguntas difíceis e respostas incorretas?
Referências
[1] Walsh B. A. & Blewitt, P. (2006). The effect of questioning style during storybook reading on novel vocabulary acquisition of preschoolers. Early Childhood Education Journal, 33, 273-278. 10.1007/s10643-005-0052-0.[3]
[2] Cahill, R. (2019). Questions during shared book reading with preschoolers need to be more challenging. Disponivel em https://www.uth.edu/news/story.htm?id=70699746-aed9-4b28-b157-a49a57e26413
[3] Deshmukh R. S., Zucker T. A., Tambyraja S. R., Pentimonti J. M., Bowles R. P., Justice L. M. (2019). Teachers’ use of questions during shared book reading: Relations to child responses. Early Childhood Research Quarterly, 49, 59-68.
Livros
De Ruiter, E. (2011). Wroooaaaaah! Hasselt: Clavis.
Klinting, L. (2013). Kasper en Flip in de werkplaats. Utrecht: Veltman.
Pfister, M. (2013). Max en de toverstenen. Rijswijk: De Vier Windstreken.
Tradução e adaptação de Cecília Aguiar