Algumas crianças mostram um maior conforto perante novas situações e partem logo para a ação, enquanto outras são mais cautelosas e precisam de mais tempo e de suporte dos adultos para se sentirem seguras… Outras crianças conseguem lidar bem com muita estimulação sensorial, outras têm pouca tolerância ao barulho e atividade ao seu redor.
Todas as crianças nascem com um temperamento único, que não é certo ou errado. O temperamento remete para diferenças individuais que existem antes dos aspetos cognitivos da personalidade se desenvolverem [1,2]. Estas predisposições iniciais têm impacto nas respostas afetivas, atencionais e motoras das crianças [1,2]. O temperamento é, assim, uma importante variável no desenvolvimento da criança, uma vez que tem impacto na maneira como experiencia e reage ao ambiente que a rodeia [3].
Quais são as maiores dimensões do temperamento?
Durante a infância, três dimensões têm vindo a ser consistentemente encontradas nos relatos dos pais sobre o temperamento das crianças [1,4]:
- Extroversão – relacionada com emocionalidade positiva, nível de atividade, impulsividade e tomada de risco. Inclui assertividade, emoções positivas, níveis baixos de timidez;
- Afetividade negativa – relacionada com medo, raiva, tristeza, desconforto, reatividade, emocionalidade negativa. Inclui aspetos como ansiedade, depressão, vulnerabilidade;
- Controlo por esforço – inclui a capacidade de gerir voluntariamente a atenção e inibir ou ativar o comportamento conforme necessário para se adaptar ao meio, especialmente quando a criança não o quer fazer. Inclui competências para focar a atenção quando existem distrações, para não interromper os pares, para se sentar quando necessário, para realizar uma tarefa que não gosta. Envolve ordem, autodisciplina, deliberação, empatia.
Estas características desempenham um papel importante nas interações sociais e no funcionamento social e emocional das crianças. Por exemplo, níveis mais elevados de controlo por esforço têm sido associados a menos problemas de comportamento e a níveis mais elevados de competência social [2]. Crianças com níveis mais elevados de emocionalidade negativa e baixo controlo atencional podem apresentar um risco aumentado de ansiedade e depressão posteriores [2]. Adicionalmente, crianças com níveis mais elevados de extroversão, quando associados a baixas competências de regulação emocional, poderão estar associados a défices de atenção ou hiperatividade [5].
Qual o papel das interações no temperamento das crianças?
As crianças não nascem com as suas características temperamentais completamente desenvolvidas. Será ao longo do tempo e através da interação com o ambiente que a criança irá construindo o seu temperamento, permitindo que características como a introversão e extroversão vão emergindo, quando antes não eram visíveis, e a impulsividade vá diminuindo, por exemplo [1].
Conhecer o temperamento de cada criança poderá ajudar os adultos a compreender e a antecipar determinados comportamentos [3]. Algumas questões que podem surgir:
- Nível de atividade: Quão ativa é a criança?
- Emocionalidade positiva: Com que frequência a criança sorri na presença de outras pessoas?
- Emocionalidade negativa: Com que facilidade a criança fica com medo, frustrada, zangada ou triste?
- Reações ao desconhecido: Quão confortável fica a criança perante novas pessoas e/ou situações?
- Atenção e nível de concentração: Quão bem a criança presta atenção e se concentra numa determinada tarefa?
O modo como os adultos respondem e se adaptam às crianças pode atenuar alguns dos aspetos desafiadores do seu temperamento. Na rotina diária da sua sala, é um desafio maior lidar com a impulsividade ou com a timidez das crianças? Quais lhe parecem beneficiar mais do seu apoio?
Referências
[1] Rothbart, M. K. (2011). Becoming who we are: Temperament and personality in development. New York, NY: Guilford Press.
[2]. Rothbart, M.K. & Bates, J. E. (2006). Temperament. In N. Eisenberg, W. Damon, and R. M. Lerner (Eds.), Handbook of child psychology: Vol 3, Social, emotional, and personality development (6th ed., pp. 99-166). New York, NY: Wiley.
[3] Encyclopedia on Early Childhood Development (2012). Temperament: Synthesis. In M. K. Rothbart (Ed.), Temperament. Disponível em http://www.child-encyclopedia.com/temperament/synthesis.
[4] Lopes, A. M. (2011). Estudo das Qualidades Psicométricas do Children Behavior Questionaire (CBQ) para Avaliação do Temperamento de Crianças Portuguesas entre os 3 e os 5 anos. Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica, Universidade do Minho.
[5]de la Osa, N., Granero, R., Penelo, E., Domènech, J. M., & Ezpeleta, L. (2013). The short and very short forms of the children’s behavior questionnaire in a community sample of preschoolers. Assessment, 21, 463-76. doi:1073191113508809.