A mãe da Estefânia está frustrada. Estava a falar com a sua filha a caminho de casa quando descobriu que as crianças passaram o dia todo a brincar. Este é o terceiro dia consecutivo em que a Estefânia ‘não aprendeu’ nada! Como é que isto se relaciona com a garantia do educador de que as crianças aprendem algo novo todos os dias?
A compreensão das expectativas mútuas, assim como dos objetivos e práticas pedagógicas dos educadores e famílias é uma das condições básicas para proporcionar às crianças um ambiente de desenvolvimento coerente e significativo. Portanto, é importante estabelecer e manter relações positivas e uma comunicação contínua com as famílias.
O que pode ajudar a estabelecer estas relações?
1. Conhecer as necessidades das famílias
Estudos feitos por investigadores Noruegueses sugerem que a cultura pedagógica da Educação de Infância corresponde às expectativas dos pais de estatuto socioeconómico médio, enquanto as famílias de baixo estatuto socioeconómico têm mais dificuldade em identificar-se com a mesma [1]. Isto pode levar ao distanciamento das famílias de baixo estatuto socioeconómico e tornar a sua cooperação com o/a educador/a menos eficaz. Como podemos combater esta tendência? Antes da inscrição da criança, a/o creche/jardim de infância pode entrevistar os pais sobre as suas expectativas em relação ao estabelecimento. A entrevista não deve abordar apenas questões organizacionais, mas também os valores que são importantes para a família. É também uma ótima oportunidade para debater com os pais diferentes maneiras de alcançar os objetivos. Por exemplo, a conversão de atividades iniciadas pela criança em atividades orientadas para a aprendizagem, em vez de reservar períodos de tempo restritos durante o dia para ‘ensinar’. A prevenção de potenciais mal-entendidos pode evitar a frustração dos pais e dos educadores ao longo do tempo.
2. Partilhar a missão do jardim de infância
Os educadores podem melhorar a cooperação com as famílias, fornecendo um documento onde se define a missão e a filosofia da/o creche/jardim de infância, e que está subjacente ao seu trabalho pedagógico [2, 3]. É importante que este documento especifique, entre outras coisas, o papel do contexto educativo e o papel dos educadores (incluindo metas e exemplos); questões relacionadas com o papel das famílias na definição das práticas diárias (definindo as áreas de responsabilidade dos pais e do contexto educativo); e explique o processo de tomada de decisão [2]. De forma a garantir que as regras de funcionamento do contexto educativo são conhecidas, compreendidas e aceites pelas famílias, estas podem ser discutidas com os pais antes da criança ser matriculada. Também é importante garantir que os documentos relevantes estão disponíveis para as famílias em papel e online, bem como nos idiomas de todas as partes envolvidas.
3. Estabelecer canais de comunicação recíproca com as famílias
A comunicação contínua entre o/a educador/a e a família sobre a organização do trabalho da/o creche/jardim de infância é um dos aspetos mais importantes da sua cooperação. Uma comunicação efetiva deve ser recíproca, mais especificamente, tanto a família quanto o/a educador/a devem não só poder trocar informação, mas também reagir à informação partilhada, fornecendo uma opinião ou fazendo uma pergunta [4].
Na prática, os educadores têm várias possibilidades para assegurar uma comunicação recíproca, incluindo soluções em formato online, como fóruns de discussão fechados na Internet (ex. no site da escola); ou presenciais, como por exemplo, reuniões de pais. A responsabilidade do processo de comunicação pode também ser parcialmente delegada nos próprios pais, por exemplo, organizando um esquema de contacto de pais para pais.
4. Assegurar que os Pais ganham com a cooperação
O apoio profissional pode influenciar positivamente o ambiente de aprendizagem das crianças em casa. Por exemplo, os pais que recebem apoio e orientação de forma a facilitar o desenvolvimento da literacia das crianças são mais propensos a proporcionar às crianças experiências valiosas nesta área e, em consequência, as competências destas crianças melhoram [5]. Assim, a cooperação com as famílias deve ir além do ambiente escolar e incluir oportunidades para os pais melhorarem as suas próprias competências e conhecimentos. O/A educador/a podem, por exemplo, disponibilizar materiais educativos às famílias, o que lhes permitirá compreender melhor os processos de desenvolvimento das crianças, e fornecer orientações sobre como estabelecer relações próximas e positivas ou lidar com seus comportamentos mais desafiantes. Esta abordagem tem o potencial de promover uma melhor compreensão e maior abertura às práticas propostas pela/o creche/jardim de infância.
Partilhe connosco práticas que se mostraram eficazes no seu contexto!
A mensagem original foi escrita por Olga Wyslowska (Universidade de Warsaw). Tradução e adaptação de Carolina Santos.
Referências:
[1] Stefansen, K., & Skogen, K. (2010). Selective identification, quiet distancing: Understanding the working-class response to the Nordic daycare model. Sociological Review, 58(4), 587–603.
[2] Standardy opieki i edukacji dzieci do lat 3. (2019). Fundacja Rozwoju dzieci im. Komeńskiego. Retirado de: www.najmlodsi.org.pl
[3] Wysłowska. O., Pacholczyk-Sanfilippo. M., Lubomirska. K., (2020). Żłobki w wybranych krajach europejskich. Wydawnictwo Uniwersytetu Warszawskiego, Warszawa.
[4] Epstein, J. L., & Sanders, M. G. (2002). Family, school, and community partnerships. Handbook of parenting: Vol. 5. Practical issues in parenting, 407-437.
[5] Epstein, J. L. (1991). Effects on student achievement of teacher practices of parent involvement. In S. Silvern (Ed.), Advances in reading/language research: literacy through family, community, and school interaction (Vol. 5, pp. 261–276). Greenwich, CT: JAI.
Somos alunas do 1º ano de Mestrado em Educação Pré-Escolar do ISPA e foi-nos proposto, pela docente da unidade curricular de Intervenção Precoce, escolher um artigo do blog Primeiros Anos para desenvolvê-lo e comentá-lo no âmbito dos eixos fundamentais desta unidade curricular. Assim, considerámos fundamental escolher este artigo, devido ao tema nos ser tão significativo e sensível. Como futuras Educadoras de Infância, pretendemos valorizar não só as crianças como as suas famílias, tendo consciência que saber escutar o outro é, acima de tudo, alargar os nossos conhecimentos perante o que nos rodeia. Um educador necessita de estar em constante reflexão, proporcionando aprendizagens significativas, através de um constante questionamento sobre o porquê e para quê, de modo a garantir que as crianças se sintam competentes, seguras e desafiadas durante o seu processo de aprendizagem. Quando o educador está verdadeiramente disponível e observa atentamente os comportamentos das crianças – procurando saber os seus gostos, a forma como se relaciona com os outros – provoca a curiosidade e autonomia nas crianças, deixando-as mais seguras nas suas explorações.
Deste modo, durante este processo de reflexão sobre o artigo, questionávamo-nos – como podemos, mais e melhor, comunicar com as famílias? Sabendo como é importante documentar o desenvolvimento e aprendizagem da criança, refletimos que quando esta comunicação é feita com as famílias num ambiente de escuta, afeto, empatia e cooperação, permitimos também uma reflexão sobre como encaram a criança e a possibilidade de juntos reconhecermos o quanto esta é competente. A família é a maior aliada neste processo – por essa razão, quando é envolvida e o/a educador/a partilha a sua intencionalidade pedagógica de forma clara, abre-se uma comunicação muito rica entre famílias e profissionais, sublinhando que as crianças estão constantemente a adquirir aprendizagens.
Pensando agora no contexto específico da Intervenção Precoce, uma relação de confiança e cooperação com as famílias vai permitir ainda “construir estratégias educativas comuns, ultrapassar os problemas de uma forma mais eficaz e gratificante” (Deslandes, 2001, citado por Mata e Pedro, 2021). Como nos evidencia Dunst (2010, citado por Carvalho et al., 2016): “a maneira “como” o apoio é prestado importa tanto, se não mais, quanto o que se faz” (p.91).
Esta reflexão tranquilizou-nos e ajudou-nos a sentirmo-nos mais seguras, percebendo que somos seres inacabados e em constante aprendizagem porque o mais importante é, sem dúvida, uma constante reflexão e respeito permanente, compreendendo que não se é educador sozinho e que só através de um ambiente de escuta ativa, partilha e cooperação, conseguimos chegar a cada criança e família.
Catarina Gomes da Silva e Marta Gil Alves com Ana Teresa Brito. Mestrado em Educação Pré-escolar e Educação Pré-escolar e 1º CEB. Unidade Curricular de Intervenção Precoce. ISPA – Instituto Universitário.
Muito obrigada por escolherem este artigo e pela vossa reflexão! Esperamos que as nossas publicações continuem a ir ao encontro dos vossos interesses e práticas, e que continuem a partilhar connosco.
A cooperação entre escola e família tem sido um tema bastante abordado por nós, enquanto alunas do Mestrado em Educação Pré-Escolar e Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1º CEB. Neste sentido, consideramos fundamental que a escola e a família colaborem entre si, consolidando, assim, uma parceria eficaz. O nosso percurso académico interliga-se diretamente com o artigo, por isso, decidimos comentá-lo, visto que, ao longo do tempo, temos vindo a refletir sobre o quão é crucial a família no desenvolvimento de uma criança, revelando ser o contexto mais presente da mesma. Na unidade curricular de Intervenção Precoce temos pensado sobre como podemos corresponder, enquanto educadoras (fazendo parte de uma equipa transdisciplinar), mais do que às necessidades individuais de cada criança, às necessidades, vontades e desejos de toda a família, compreendendo aquilo que mais ambiciona e respeitando, sempre, qualquer opinião ou decisão evidenciada. Uma vez que, a criança é um ser holístico, formado por múltiplas realidades, é necessário, para que a sua aprendizagem ocorra da forma mais completa possível, todas as suas realidades sejam tidas em conta no seu processo de aprendizagem, dando-se especial foco às famílias que são quem conhece melhor as crianças. Ao falarmos de famílias estamos a falar da “principal estrutura organizadora no desenvolvimento de uma criança” (Bronfenbrenner, 1979, citado por Carvalho et al., 2016, p.83) Assim, como é referido no artigo do Blog dos Primeiros Anos, é fundamental, tanto para as famílias como para as/os educadoras/es, que exista uma compreensão de expectativas mútuas, bem como das finalidades educativas das práticas pedagógicas dos mesmos, garantindo, assim, a existência de condições básicas para permitir às crianças o seu desenvolvimento harmonioso e significativo. Deste modo, a entrevista inicial que se realiza aos pais não se deve debruçar apenas em questões organizacionais, mas também nos valores e nas expectativas que são importantes para as famílias, evitando assim frustrações e mal entendidos de ambas as partes (Santos, 2021). Silva et al. (2016) afirmam que “um diálogo que facilite relações de confiança permite aos pais/famílias expor as suas opiniões, expectativas e dúvidas e ser esclarecidos sobre as opções tomadas pelo/a educador/a” (p.21), o que talvez pudesse ter sido feito com a mãe da Estefânia, no início do ano letivo, de forma a perceber quais seriam as suas expectativas em relação à escola. Desta forma, tal como é referido no Blog Primeiros Anos, a existência de uma comunicação eficaz e contínua entre o educador e a família, sobre a planificação e organização do contexto educativo é um dos aspetos mais determinantes para a existência de uma cooperação entre ambas as partes. Por outro lado, a existência de uma relação de confiança entre educador/família permite que o educador tome conhecimento e compreenda melhor o ambiente familiar da criança, adequando assim, igualmente, a sua intervenção (Silva et al., 2016). Focando-nos agora na parceria escola/família em intervenção precoce, de acordo com o Modelo Integrado de Intervenção Precoce na Infância, proposto por Carl Dunst (2000, citado por Carvalho et al., 2016), o trabalho de Intervenção Precoce na Infância (IPI) baseia-se na adoção de práticas centradas na família. Ao falarmos numa abordagem centrada na família estamos a falar de “um conjunto de práticas que reconhecem a centralidade da família e promovem as suas forças e capacidades” (Trivette & Dunst, 2005, citado por Carvalho et al., 2016, p.77). Isto é, nesta abordagem, as famílias acabam por ser acompanhadas enquanto cuidadoras, partindo-se dos seus pontos fortes, únicos e diversos enquanto pessoas e família, sendo elas as principais responsáveis no que diz respeito ao processo de decisão e na prestação de cuidados à criança. (Carvalho et al., 2016). A qualidade da relação que se estabelece entre os profissionais de educação e as famílias acaba por ser um fator crucial no percurso que as famílias com filhos com necessidades especiais têm de percorrer, uma vez que estes dois intervenientes se constituem-se focos de apoio, aquando o processo de inclusão e aprendizagem da criança, devendo empenhar-se na missão que os une, a educação das crianças (Ribeiro, 2012). Desta forma, para que esta colaboração funcione terá que existir um esforço, envolvimento e dedicação de todos os membros participantes, uma vez que, apesar de caber à família o principal papel de educar, a criança que passa a frequentar a creche ou jardim de infância, acaba, com a família, por fazer parte desta comunidade.
A realização deste comentário foi uma mais-valia para o nosso crescimento pessoal e enquanto futuras profissionais de educação, permitindo-nos ganhar consciência de que todas as crianças e as suas famílias merecem ser incluídas, respeitadas e ouvidas, no que diz respeito ao seu desenvolvimento e processo de aprendizagem.
Ana Rita Pires, Maria Menezes e Marta Águas com Ana Teresa Brito. Mestrado em Educação Pré-escolar e Educação Pré-escolar e 1º CEB. Unidade Curricular de Intervenção Precoce. ISPA – Instituto Universitário.
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