Durante o jogo livre, a educadora junta-se a um pequeno grupo de crianças que brinca com blocos e miniaturas de animais. A educadora ouve as ideias das crianças, questiona, adiciona informação e faz ligações com experiências prévias noutros contextos. Educadora e crianças apreciam a companhia uns dos outros.

Os/as educadores/as planificam e organizam a rotina das crianças e as suas experiências em torno de diferentes atividades e rotinas, com diferentes tipos de configuração social [1]. Esta planificação de tempo e espaço apresenta vários desafios aos/às educadores/as em contexto de creche. Parece ser importante encontrar o equilíbrio entre, por um lado, dar tempo e espaço às crianças para explorar o ambiente e os materiais livremente e, por outro lado, envolvê-las em momentos estimulantes que introduzam novo vocabulário, incitem o seu raciocínio e instiguem a sua criatividade. Para crianças pequenas, em idade de creche, uma das estratégias para resolver esta aparente dicotomia será tirar o máximo proveito das experiências, oportunidades e conversas quotidianas para concretizar objetivos de aprendizagem, promovendo assim interações de qualidade [2].

A forma como os/as educadores/as planificam e organizam as rotinas das crianças ao longo do dia influencia a qualidade das interações educador-criança. Isto significa que, apesar do largo reconhecimento da importância das interações entre os/as educadores/as e as crianças para o desenvolvimento futuro, este não é um aspeto estático, mas sim um que flutua ao longo do dia, em função de fatores como a configuração da atividade em curso [1, 3, 4].

Quando é que as interações são de maior qualidade, em contexto de creche?

Recentemente, o projeto Quality Matters procurou responder à questão “Como e sob que condições tem efeito a qualidade em educação de infância?”. Os resultados deste projeto [5, 6] sugerem que, em comparação com as atividades em grande grupo, os momentos organizados em pequeno grupo permitiam que:

  • os/as educadores/as e as crianças estivessem em maior sintonia e desfrutassem mais da companhia uns dos outros, resultando num clima mais próximo e caloroso;
  • os/as educadores/as estivessem mais disponíveis para prestar atenção às necessidades das crianças e dar-lhes resposta, tanto a nível emocional como a nível cognitivo;
  • os/as educadores/as privilegiassem mais as ideias e opiniões das crianças, seguindo os seus interesses;
  • as crianças tentassem mais vezes iniciar interações positivas com os seus pares;
  • as crianças estivessem mais envolvidas, focadas e entusiasmadas.

Que atividades tendem a ser organizadas em pequeno grupo? E em grande grupo?

No âmbito deste projeto, foram observados alguns momentos frequentes em contexto de creche, nomeadamente atividades de promoção de linguagem, raciocínio e conhecimento do mundo (entre outros), atividades artísticas (e.g., artes plásticas, dança) e atividades de jogo livre. Os resultados indicam que 80% das atividades com conteúdos de promoção de linguagem, raciocínio, conhecimento do mundo, entre outros, eram realizadas em contexto de grande grupo. Este padrão invertia-se nos momentos de jogo livre e atividades artísticas, onde 87% e 60% das atividades eram realizadas em pequeno grupo ou formato livre [5]. Em suma, os/as educadores/as de creche parecem favorecer a organização em grande grupo para promover a linguagem, o raciocínio e/ou o conhecimento sobre o mundo.  

O que torna os momentos de grande grupo e pequeno grupo tão distintos?

Parece claro que as atividades organizadas em grande grupo colocam exigências extraordinárias à capacidade dos/das educadores/as para gerir comportamentos desafiantes, levando-os/as a ser mais diretivos/as, assumindo as rédeas da atividade. Isto poderá tornar mais difícil para os/as educadores/as ouvirem as opiniões das crianças e seguirem os seus interesses e/ou limitar a sua disponibilidade para interagirem de forma calorosa, sensível e responsiva com cada criança.

Por sua vez, os momentos organizados em pequeno grupo, em que esta disponibilidade dos/as profissionais é maior e as interações entre as crianças são mais calorosas e próximas, podem ter muito potencial para promover a aprendizagem e desenvolvimento. Desta forma, será vantajoso tirar o máximo proveito de momentos com esta organização para, de forma intencional e previamente planificada, introduzir e expandir importantes conteúdos de aprendizagem.  

Esta abordagem não substitui, claro está, os momentos em grande grupo. Mas, e se os conteúdos de linguagem, raciocínio, conhecimento do mundo, entre outros, pudessem também ser trabalhados em contexto de pequeno grupo? Talvez possa ser proveitoso orientarmos o nosso olhar para captar momentos de exploração livre com potencial para aprofundar conteúdos de linguagem, literacia, matemática, ciência e aspetos relacionados com as ciências sociais e as artes.

Enquanto educador/a de creche, de que forma concilia os momentos de exploração livre com oportunidades estimulantes para promover o raciocínio e a linguagem? Partilhe connosco os desafios que se colocam na sua prática e as estratégias que implementa!

Recurso

Quality Matters!

Referências

[1] Cabell, S. Q., DeCoster, J., LoCasale-Crouch, J., Hamre, B. K., & Pianta, R. C. (2013). Variation in the effectiveness of instructional interactions across preschool classroom settings and learning activities. Early Childhood Research Quarterly, 28(4), 820-830. doi:10.1016/j.ecresq.2013.07.007

[2] National Association for the Education of Young Children [NAEYC]. (2009). Developmentally appropriate practice in early childhood programs serving children from birth through age 8: Position statement. Retirado do website da NAEYC: https://www.naeyc.org/sites/default/files/globally-shared/downloads/PDFs/resources/position-statements/PSDAP.pdf

[3] Vitiello, V. E., Booren, L. M., Downer, J. T., & Williford, A. P. (2012). Variation in children’s classroom engagement throughout a day in preschool: Relations to classroom and child factors. Early Childhood Research Quarterly, 27(2), 210-220. doi:10.1016/j.ecresq.2011.08.005

[4] Whittaker, J. E. V., Williford, A. P., Carter, L. M., Vitiello, V. E., & Hatfield, B. E. (2018). Using a standardized task to assess the quality of teacher–child dyadic interactions in preschool. Early Education and Development, 29(2), 266-287. doi:10.1080/10409289.2017.1387960

[5] Cadima, J., Guedes, C., Aguiar, T., Aguiar, C., & Barata, C. (2019). QualityMatters: Divulgação de resultados. Retirado do website do projeto Quality Matters: https://www.fpce.up.pt/qualitymatters/convites/Seminario-Disseminacao-Resultados-QM.pdf

[6] Guedes, C., Cadima, J., Aguiar, T., Aguiar, C., & Barata, C. (2020). Activity Settings in Toddler Classrooms and Quality of Group and Individual Interactions. Journal of Applied Developmental Psychology, 67, 101100. doi: 10.1016/j.appdev.2019.101100

O pequeno e o grande grupo, a exploração livre e os momentos estimulantes em creche: Um jogo de equilíbrios

Carolina Guedes

Mestre em psicologia pela Universidade do Porto, colaborou no projeto Quality Matters! Encontra-se atualmente a desenvolver o seu projeto de doutoramento, focado no desenvolvimento de competências de autorregulação durante a infância. Os seus principais interesses de investigação relacionam-se com o desenvolvimento da criança nos seus primeiros anos de vida e com a qualidade dos contextos educativos, em contexto de creche e pré-escolar.

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