Muitos de nós relembram com carinho comidas, afetos ou histórias do passado contadas pelos e pelas avós. Os/as avós envolvem-se na educação das crianças como: i) principais cuidadores na ausência ou indisponibilidade dos pais; ii) fonte de apoio financeiro ou material, e iii) como cuidadores durante o tempo de trabalho dos pais (a tempo inteiro ou só quando a criança não está na escola) [1]. Este retrato internacional descreve bem a situação portuguesa [2]. No nosso país, a situação mais frequente é o/a avó “que ajuda”, levando a criança à escola, dando as refeições, levando ao parque, etc. Vamos conhecer melhor este grupo.

Estes/as avós têm impacto no desenvolvimento da criança principalmente em três áreas: física e psicomotora, socioemocional e cognitiva [1]. Os/as avós podem também ser uma fonte de valores e disciplina [4]. O que a revisão de literatura [1] não esclarece é se o impacto dos/as avós é positivo, porque, na verdade, a resposta não é direta: depende da idade dos avós, da sua escolaridade, saúde, estrato socioeconómico, etnicidade, sexo, etc. Por exemplo, os/as avós mais escolarizados favorecem o desenvolvimento linguístico enquanto os/as avós menos escolarizados o desenvolvimento psicomotor [1,6]. Os primeiros parecem favorecer a autoestima e os segundos a resiliência.

Em Portugal, os/as avós cuidadores secundários são sobretudo mulheres, com mais de 65 anos, com baixa escolaridade e problemas de saúde ligeiros/moderados [2].. Algumas destas mulheres nasceram e estudaram no Estado Novo, por vezes crescendo em famílias tradicionais e com poucos recursos. Algumas estudaram, são de classe média ou média alta, tiveram profissões bem remuneradas, exerceram cargos de chefia ou foram bem-sucedidas na sua carreira. Algumas foram revolucionárias e lutaram por um Portugal mais democrático, outras voluntárias em missões arriscadas, outras donas de casa que cuidaram e ajudaram a sua família prosperar, …tantas histórias. As avós são o retrato das mulheres idosas portuguesas.

As avós cuidadoras levam ou trazem os/as netos/as à escola. Que significado terá para elas a educação de infância? Os estudos em contexto português são escassos.  Em termos genéricos, as avós parecem valorizar a educação de infância e o trabalho dos/as profissionais de educação [5]. O dado mais interessante é que os/as avós que compreendem melhor a missão das escolas são aqueles/as que contribuem mais para o desenvolvimento das crianças [3]. Importa comunicar a missão da educação de infância!

Recomendações

Um relatório da Zero to Three e do Banco Mundial considera serem urgentes políticas públicas para os/as avós e alerta que os/as “grandparents are helping to build the brains of … young children (os avós contribuem para o neurodesenvolvimento…em crianças pequenas) ” [4, p.15]. Com base neste relatório, consideram-se as seguintes propostas.

Conhecer os/as avós para promover melhores relações com as crianças e com as famílias.

Reuniões com avós – Se os/as avós entregam ou recebem as crianças ao fim do dia, porquê só reunir com os pais ou as mães? Porque não partilhar com eles/as informação? Porque não ouvi-los/as? (Atenção às cadeiras minúsculas: Quando reunir com avós, não se esqueça de mobiliário adequado).

Partilhar valores, informação e a educação – Olhemos para o exemplo da alimentação. Os/as avós têm impacto nutricional quando fornecem o jantar e as refeições ao fim de semana. Contudo, por vezes não são convidados/as para as atividades de sensibilização alimentar das escolas. As escolas que estão a fazer um esforço de educação para a alimentação saudável e sustentável devem incluir quem alimenta. Tal como este, pode considerar inúmeros temas para partilhar informação.

Incluir – Os tempos e as mentalidades mudam com os avanços no mundo tecnológico. Atualmente, debatemos a sustentabilidade ambiental, os direitos de todos, as identidades de género, entre outros aspetos. Os/as avós não se podem sentir excluídos/as. Não se demita de incluir avós com opiniões contrárias à sua ou às perspetivas atuais. Um país mais democrático, plural e sustentável constrói-se com todos/as.

O currículo educativo deve incluir a família – uma parte importante da família são os/as avós.

Num tempo em que os/as educadores/as ainda se adaptam a incluir os pais e as mães, incluir os/as avós pode parecer demasiado desafiante, mas os exemplos de experiências bem-sucedidas são uma partilha valiosa. Aguardamos a partilha.

Referências

[1] Sadruddin, A. F., Ponguta, L. A., Zonderman, A. L., Wiley, K. S., Grimshaw, A., & Panter-Brick, C. (2019). How do grandparents influence child health and development? A systematic review. Social Science & Medicine, 239, 112476. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2019.112476

[2] Relatório Europeu: Grandeparents Plus (2013). A prestação de cuidados pelos avós na Europa: as políticas familiares e o papel dos avós na prestação de cuidados. Fundação Calouste Gulbenkian.

[3] Barnett, M. A., Scaramella, L. V., Neppl, T. K., Ontai, L. L., & Conger, R. D. (2010). Grandmother involvement as a protective factor for early childhood social adjustment. Journal of Family Psychology, 24(5), 635–645. https://doi.org/10.1037/A0020829

[4] Kisner et al., (2017). Grandparents. Who care: Literature revision. Zero to Three.

[5] Ramos, N. M. et al. (2019). Relação avós e netos em Portugal em tempo de pandemia Covid 19. In R. Azambuja, E. Rabinovich, & S. Neves (org.). Envelhecimentos & Avosidades (pp. 13-23).

[6] Del Boca, D., Piazzalunga, D. & Pronzato, C. The role of grandparenting in early childcare and child outcomes. Rev Econ Household 16, 477–512 (2018). https://doi.org/10.1007/s11150-017-9379-8

Os nossos avós podem fazer a diferença

Marina Fuertes

Marina Fuertes é Professora Coordenadora com Agregação da Escola Superior de Educação (Instituto Politécnico de Lisboa) e membro integrado do Centro de Psicologia da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP). É doutorada e mestre em Psicologia com pós-doutoramento na Harvard Medical School. Obteve vários financiamentos e prémios científicos tendo publicado diversos artigos – recentemente na Developmental Psychology.

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