Quem é a figura de referência para uma criança? Geralmente – mãe, pai, avós, irmãos mais velhos, o/a educador/a favorita. Mas será que só as figuras de referência são importantes? Investigações recentes sugerem que mesmo numa idade precoce como aos três anos, é mais provável que as crianças concordem com o que os outros fazem ou dizem. E não se trata apenas de um desejo de se conformar à referência ou às preferências de uma pessoa. As crianças querem pertencer ao grupo e fazer parte de uma comunidade maior [1].

Se essa é a regra, é exatamente isso que farei!

Mais de cem crianças de três anos e meio foram convidadas a participar de um estudo [1]. Cada criança, juntamente com seus pais, foi convidada a ajudar a preparar uma sala para uma pequena festa. As crianças indicaram primeiro quais os elementos que queriam usar (os investigadores prepararam várias opções de brinquedos para festas). Em seguida, foram informadas de que outra festa também estava a ser preparada na sala ao lado, para a qual outros objetos foram escolhidos. Pouco mais de ¼ das crianças, após conhecerem as escolhas das pessoas que preparavam a festa na outra sala, mudaram a sua primeira escolha e escolheram a mesma coisa que outra pessoa.

As crianças estavam mais propensas a mudar as suas escolhas iniciais do objeto da festa quando as escolhas dos outros eram apresentadas como regras e normas: “tu deves escolher uma taça verde” ou “a regra é escolher uma taça verde para as festas” do que quando eram apresentadas como uma preferência: “nós costumamos usar sempre copos verdes”. Não importava se a outra festa era preparada por outra criança ou por um adulto [1]. Estes resultados sugerem que mesmo as crianças pequenas tentam adaptar o seu comportamento e as suas escolhas às regras do grupo. Isto sugere que elas querem fazer parte da comunidade, seguindo normas específicas.

Isto não é permitido

As crianças não só são capazes e desejosas de agir de acordo com as regras que lhes são ditas, mas também são capazes de sentir o que pode e não pode ser feito sem diretrizes verbais. Este comportamento social é ilustrado numa experiência realizada em 2014 pela Universidade de Washington. No vídeo: Toddlers regulate their behaviour to avoid make adults angry, podemos observar uma criança sentada no colo da mãe a brincar com os objetos dados pelo investigador.

Ele parece feliz e claramente interessado nos brinquedos. Depois de algum tempo, um observador entra na sala e mostra a todos que não aprova o tipo de comportamento lúdico apresentado pelo investigador. A criança muda a sua abordagem da situação. Ao ver a desaprovação do observador, o menino sente-se desconfortável e deixa de quer brincar com os novos objetos fornecidos pelo investigador.

Vou fazer da maneira correta

Vinte crianças entre quatorze e dezoito meses de idade observaram um adulto a realizar várias ações sobre vários objetos. Durante algumas das ações, o adulto deixou claro que o resultado alcançado era o esperado (“Sim!”), durante outras ações o investigador comportou-se como se tivesse cometido um erro (“Woops!”). Após cada manifestação, as crianças receberam os mesmos objetos para manipularem por iniciativa própria. Descobriu-se que as crianças tinham o dobro da probabilidade de imitar as ações intencionais do adulto do que as ações acidentais. Isto significa que antes dos dezoito meses de idade as crianças podem entender as intenções dos outros. Segundo os investigadores, isto sugere um passo no desenvolvimento da cognição social e das habilidades culturais [2].

Eu faço parte do grupo, portanto, vou ajudar-vos

Outro estudo envolveu quase 50 crianças de dezoito meses. Cada criança estava numa sala com um dos pais (que estava a ler um jornal). O investigador observava o comportamento da criança e, ou imitava exatamente o que a criança estava a fazer (brincar, mostrar algo, ir até a porta, etc.), ou não. Após esta fase do estudo, ou o investigador ou outro adulto precisava de ajuda. As crianças que tinham sido imitadas pelo investigador na fase anterior tinham uma probabilidade significativamente maior de ajudar o adulto do que aquelas que não tinham sido imitadas. Estes resultados mostraram que a imitação tem consequências sociais positivas: ela promove uma orientação pró-social dirigida a outras pessoas [3].

Ajude-me a aprender as regras

Um vínculo social é mais provável e mais forte se nos comportarmos como outras pessoas no nosso grupo. A modelagem específica do comportamento (aprender o comportamento da pessoa implicada) e a formação de atitudes a partir do momento em que as crianças estão no berçário são importantes e podem ajudá-las no futuro – a encontrar amigos mais facilmente no berçário, a ajudar os outros ou a seguir regras que foram aprendidas e que são valiosas. Como fazer isso?

  • Dar o exemplo com o comportamento, por exemplo, fazendo as mesmas ações que são organizadas para as crianças (dançar com elas, brincar com elas, fazer o seu próprio desenho); não esquecer de usar palavras mágicas: por favor, obrigado, desculpa;
  • Seguir o comportamento e as ações das crianças, por exemplo, se uma criança começar a olhar as figuras de um livro, sentar-se ao seu lado e começar a olhar para outro livro;
  • Introduzir alguns princípios-chave no grupo para que as crianças se lembrem deles e se apropriem deles, por exemplo, “Nós ajudamos-nos mutuamente”, “Nós sorrimos muito”.

Este post foi um contributo de  Kamila Wichrowska (University of Warsaw)

Referências:

  1. Li, L., Britvan, B., & Tomasello, M. (2021). Young children conform more to norms than to preferences. PLOS ONE, 16(5), e0251228. DOI: 10.1371/journal.pone.0251228
  2. Carpenter, M., Akhtar, N., Tomasello, M. (1998). Fourteen- through 18-month-old infants differentially imitate intentional and accidental actions. Infant Behavior & Development, 21(2), 315–330.
  3. Carpenter, M., Uebel, J., Tomasello, M. (2013). Being mimicked increases prosocial behavior in 18-month-old infants. Child Development, 84(5), 1511–1518. pmid:23488734
As regras são para os bebés.
Marcações    

Tiago Almeida

Licenciado, Mestre e Doutorado em Psicologia Educacional. Atualmente é Professor Adjunto na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa. Tem como interesses o brincar de crianças pequenas com e sem incapacidade e o estudo da genealogia das representações de criança e infância. Adora ler romances russos nos intervalos de longas pedaladas de BTT.

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