“O segredo dos nórdicos”. “O ensino que já é modelo no mundo”. Se pesquisarmos, na internet, sobre educação de infância nos países nórdicos, rapidamente encontramos informação sobre os jardins de infância na floresta, na Noruega ou na Dinamarca, assim como informação sobre a importância dada ao brincar na Finlândia, ou sobre a excelência do sistema escandinavo. Os países nórdicos são, de facto, frequentemente descritos como inovadores e exemplares, no domínio da educação e, em particular, da educação de infância. Mas que valores, princípios e práticas têm em comum, afinal, países como a Suécia, a Islândia, a Dinamarca, a Noruega e a Finlândia?
Modelo nórdico
Nos países nórdicos, a educação de infância segue o princípio da universalidade e é considerada responsabilidade nacional. Por este motivo, em cada país, existe legislação e orientações curriculares específicas. No entanto, embora cada país tenha a sua própria história e tradição sociopedagógica, as políticas nórdicas para a educação de infância são consideradas relativamente homogéneas, existindo semelhanças que permitem descrever a existência de um modelo nórdico [1].
A tradição pedagógica nórdica assenta na/o:
- Curiosidade e criatividade das crianças;
- Direito das crianças à infância e ao bem-estar, a brincar e a aprender, e a serem ouvidas e vistas;
- Valor intrínseco da infância e do brincar, considerados o ponto de partida para as práticas pedagógicas.
O que torna o modelo nórdico único?
Abordagem holística de bem-estar, desenvolvimento e aprendizagem – Preferida em detrimento de uma abordagem predominantemente académica [2], a abordagem holística prevê que o cuidar, o brincar e o aprender sejam promovidos de forma integrada. É privilegiada a promoção de relações de confiança, de sentido de pertença, de competências sociais, da linguagem e da comunicação das crianças. O grande objetivo desta abordagem é, através de práticas educativas adequadas, refletidas e planeadas, oferecer à criança um conjunto de experiências que promovam o seu desenvolvimento global.
Democracia e o direito de participação das crianças – Os países nórdicos têm assumido uma posição vanguardista em relação aos direitos das crianças, ancorada na visão de uma “boa infância” [3] e no valor cultural de uma pedagogia centrada na criança. A democracia, tanto ensinada como vivida, implica a responsabilidade partilhada entre gerações e permite à criança compreender melhor a sociedade em que vive. Valores como o respeito, a igualdade e a liberdade de expressão implicam que o/a educador/a ouça e tenha em conta as perspetivas da criança, incluindo-as, por exemplo, no planeamento do dia-a-dia do jardim.
Natureza e brincar ao ar livre – A realização de atividades ao ar livre é um valor muito enraizado na cultura nórdica, e o contacto permanente com a natureza é considerado fundamental para o bem-estar, desenvolvimento e aprendizagem da criança [4]. Por este motivo é tão frequente, nos países nórdicos, as crianças dormirem a sesta no exterior, brincarem na neve durante o recreio, aquecerem alimentos em fogueiras, ou frequentarem jardins de infância na floresta, debaixo de temperaturas negativas.
Que desafios?
O modelo nórdico preconiza, ainda, a formação profissional contínua dos/as educadores/as, bem como o conhecimento multidisciplinar e interdisciplinar, em permanente cooperação com as famílias das crianças. Como em muitos outros países, também a abordagem nórdica enfrenta desafios: a crescente globalização e imigração, o multiculturalismo e a diversidade, os grupos vulneráveis, a necessidade de uma abordagem sistémica à profissionalização e a integração de modelos e abordagens internacionais, são alguns dos mais comummente debatidos.
Considera estes valores diferentes dos valores expressos nas nossas Orientações Curriculares? Não serão o brincar, a democracia, ou a criatividade, valores centrais em educação de infância, também no nosso país? Como definiria o modelo Português? Aguardamos as suas opiniões!
Referências
[1] Karila, K. (2012). A Nordic perspective on early childhood education and care policy. European Journal of Education, 47(4), 584-595. doi: 10.1111/ejed.12007
[2] Jensen, B. (2009). A Nordic approach to Early Childhood Education (ECE) and socially endangered children. European Early Childhood Education Research Journal, 17(1), 7-21. doi: 10.1080/13502930802688980
[3] Einarsdottir, J., Purola, A. M., Johansson, E. M., Broström, S., & Emilson, A. (2015). Democracy, caring and competence: values perspectives in ECEC curricula in the Nordic countries, International Journal of Early Years Education, 23(1), 97-114. doi: 10.1080/09669760.2014.970521
[4] Moser, T., & Martinsen, M. T. (2010). The outdoor environment in Norwegian kindergartens as pedagogical space for toddlers’ play, learning and development. European Early Childhood Education Research Journal, 18(4), 457-471. doi: 10.1080/1350293X.2010.525931
Em primeiro lugar, quero agradecer a partilha desta informação para podermos alargar a nossa visão de um contexto de educação de infância de qualidade.
O modelo português apresenta bastantes diferenças, provenientes da nossa cultura de proteção das crianças. No entanto, existem atualmente cada vez mais escolas e playgroups que priveligiam o contato com a natureza, potencializando inúmeras aprendizagens. De igual modo, colocam em primeiro lugar o respeito pela criança e pelas suas escolhas.
Podemos assim, fundamentar estas práticas nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar uma vez que estas preconizam um conjunto de princípios que vão ao encontro dos acima identificados.